Introdução
As florestas constituem um património ímpar da vida na Terra e todos conhecemos muitos dos inúmeros benefícios que proporcionam a ecossistemas e à vida humana. Mas o seu valor transcende esses desígnios e tem vindo a incrementar-se à medida que a investigação científica progride. Por exemplo, como testemunhos silenciosos da contaminação ambiental. A capacidade de algumas espécies para atuarem como monitores passivos da presença de poluentes está perfeitamente comprovada e documentada, providenciando uma inestimável base de dados sobretudo em áreas onde as redes comuns de monitorização não chegam.
Foi neste âmbito de valorização da floresta que o projeto SAFEPINE – Avaliação da contaminação de pinheiros por poluentes emergentes foi idealizado e concretizado na linha de investigação “Ciências e Tecnologias do Ambiente” do LEPABE – Laboratório de Engenharia de Processos, Ambiente, Biotecnologia e Energia (www.fe.up.pt/lepabe), sediado na Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto (www.fe.up.pt).
O LEPABE é uma unidade de pesquisa da rede nacional de unidades de I & D, acreditada pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) e consecutivamente avaliada como "Excelente" pelos comitês internacionais por ela nomeados. A sua atividade de investigação visa obter avanços na ciência e apoiar o desenvolvimento de processos e produtos inovadores.
Os resultados do projeto podem considerar-se de alto contributo para o estado da arte, traduzindo-se num número considerável de trabalhos científicos (alguns das quais apenas recentemente publicados), e de comunicações em congressos nacionais e internacionais. Uma importante componente formativa foi também alcançada, por meio da elaboração de uma tese de mestrado.
Uma listagem das publicações resultantes deste projeto pode ser consultada na seguinte página: http://tinyurl.com/SafePine. Realçam-se as seguintes publicações:
> José Avelino Silva, Nuno Ratola, Sara Ramos, Vera Homem, Lúcia Santos, Arminda Alves. An analytical multiresidue approach for the determination of PAHs, PCBs, BFRs, HCB and musks in pine needles. Analytica Chimica Acta 851 (2015) 24-31.
> Sara Ramos. Pine needles as biosamplers for emergent pollutants. Master thesis of Integrated Master in Bioengineering-FEUP 2013.
> Nuno Ratola, José Manuel Amigo, Silvia Lacorte, Damià Barceló, Eleftheria Psillakis, Arminda Alves. Comparison of PAH levels and sources in pine needles from Portugal, Spain, and Greece. Analytical Letters 45 (2012) 508-25.
> Nuno Ratola, Arminda Alves, Lúcia Santos, Silvia Lacorte. Pine needles as passive bio-samplers to determine polybrominated diphenyl ethers. Chemosphere 85 (2011) 247-52.
> José Manuel Amigo, Nuno Ratola, Arminda Alves. Study of geographical trends of polycyclic aromatic hydrocarbons using pine needles. Atmospheric Environment 45 (2011) 5988-96.
Apoio
O projeto foi apoiado pelo COMPETE – Programa Operacional Factores de Competitividade, envolvendo um investimento elegível de 88 056,00 euros, correspondendo a um incentivo FEDER de 61 639,20 euros. Lúcia Santos, a responsável pelo SAFEPINE, considerou fundamental este apoio, possibilitando o desenvolvimento de uma área de investigação que potenciou a divulgação e publicação de diversos artigos em revistas de circulação internacional. Além disso, outro aspeto crucial que adveio do projeto foi a possibilidade de inclusão de parceiros estrangeiros de reconhecido gabarito (Universidades de Copenhaga, Creta e Lancaster e CSIC de Barcelona) na continuidade da linha de investigação desenvolvida no LEPABE. Esta vertente internacional foi fomentada em particular pelo empenho e envolvimento de Nuno Ratola, investigador do LEPABE e integrante da equipa de trabalho.
Objetivos
Em concreto, o projeto SAFEPINE visou avaliar a extensão da contaminação das florestas por poluentes orgânicos persistentes “clássicos” e “emergentes”. Quanto aos primeiros, estudaram-se os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos (PAHs), resultantes de fontes naturais (p. ex. incêndios florestais) e atividades antropogénicas ligadas à queima de combustíveis fosseis (tráfego, aquecimento doméstico, processos industriais, etc); os retardantes de chama polibromados (BFRs) e os bifenilos policlorados (PCBs), usados em mobiliário, produtos eletrónicos ou transformadores, entre outros; e os pesticidas organoclorados (OCPs), profusamente utilizados no século passado no controle de pragas animais e vegetais. Do segundo grupo, pela primeira vez, avaliou-se também a contaminação por fragrâncias sintéticas (musks), uma das famílias de poluentes emergentes que mais atenção tem despertado na comunidade científica nos últimos tempos.
Dado que o tecido florestal português é constituído predominantemente por pinheiros, utilizaram-se as agulhas destas árvores como amostradores biológicos na avaliação da contaminação atmosférica e na compreensão da mobilidade e extensão deste tipo de poluentes.
Entre os objetivos específicos destacam-se:
- O desenvolvimento de métodos analíticos de extração e quantificação expeditos (Figura 1), área em que este grupo de investigação se tem destacado, de modo a compreender as variações temporais e especiais a que estes compostos estão sujeito;
- A implementação de um plano de monitorização extenso abrangendo a recolha de agulhas de pinheiro e de amostradores passivos de ar em diversos pontos de Portugal Continental industrial e remoto.
- A aplicação de técnicas estatísticas uni- e multivariadas de análise de dados, por forma a identificar tendências temporais e espaciais para uma melhor compreensão da distribuição e comportamento ambiental destes compostos.
Figura 1. A - Exemplo de um cromatograma de uma amostra de agulhas de pinheiro (Adaptado de: J.A. Silva, N. Ratola, S. Ramos, V. Homem, L. Santos, A. Alves. Anal. Chim. Acta 851 (2015) 24-31)
Figura 1. B - Amostrador passivo contendo disco de espuma poliuretano
Figura 2. Locais de amostragem de agulhas de pinheiro utilizados para a biomonitorização dos contaminantes-alvo
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Principais resultados
- Foram desenvolvidos e validados métodos analíticos para PAHs, BFRs, PCBs, OCPs e musks em agulhas de pinheiro. Numa primeira abordagem tentou encontrar-se uma solução para cada uma das classes químicas de compostos. Posteriormente, baseando-se na experiência adquirida, foi desenvolvido um método multiresíduo, que permitiu a quantificação das cinco famílias de compostos em simultâneo. Para obter conhecimentos mais aprofundados sobre a contaminação ambiental por musks, também se desenvolveu uma metodologia analítica para a sua quantificação em produtos de cuidado pessoal. Utilizou-se uma abordagem inovadora baseada em QuEChERS, uma técnica que permite uma considerável poupança de solventes orgânicos.
- Estudaram-se fenómenos interfaciais que ocorrem à superfície das agulhas de pinheiro, sendo possível obter informação acerca da sua molhabilidade, área superficial e, por meio de microscopia ótica e de microscopia eletrónica de varrimento, conseguir dados sobre a sua morfologia. Existe uma discrepância na capacidade de retenção de PAHs entre as duas espécies de agulhas de pinheiro estudadas, Pinus pinaster e Pinus pinea. Os níveis totais de PAHs nas agulhas de P. pinaster são significativamente mais elevados que nas de P. pinea. Mas enquanto as agulhas de P. pinaster mostram uma maior afinidade para os PAHs mais “leves” (2-4 anéis aromáticos), esta correlação é no P. pinea verificada para os PAHs mais “pesados” (5-6 anéis aromáticos).
- No terreno, foram realizadas duas campanhas de monitorização, recolhendo-se amostras das duas espécies mais comuns em Portugal (P. pinea e P. pinaster) em 29 locais em Portugal continental. Os pontos de recolha foram escolhidos de modo a serem representativos de diferentes perfis de exposição, utilização de território e de densidade populacional (industrial, urbano, rural e remoto). Através das cooperações internacionais com a Universidade de Creta e do CSIC de Barcelona, foram obtidas amostras adicionais de Espanha e da Grécia. Os três países mostram níveis de PAHs totais similares, sendo os PAHs mais voláteis (3-4 anéis aromáticos) os predominantes nas áreas urbanas. Existem diferenças significativas entre locais urbanos e não-urbanos nos níveis totais e padrões de PAHs por número de anéis aromáticos, indiciando diferentes fontes de emissão.
- Quanto aos níveis de contaminantes encontrados nas agulhas de pinheiro, as áreas urbanas e industriais demonstram perfis de presença semelhantes e mais elevados, seguidos dos pontos rurais, enquanto os locais remotos apresentam concentrações consideravelmente mais baixas. Aproveitando a colaboração com a Universidade de Copenhaga (Dinamarca), foi aplicada a análise de componentes principais (PCA) para obter tendências geo-espaciais e temporais. A utilização dessa ferramenta em combinação com software de mapeamento GIS, permitiu concluir que as regiões noroeste registam maiores níveis de PAHs que as regiões do sudeste. Isto estará relacionado com a pressão urbana e a presença de indústria pesada ou portos marítimos. Verificou-se também que as zonas urbanas apresentam padrões de PAHs mais variáveis, devido a uma maior disparidade de fontes emissoras. Foi identificado uma tendência temporal, na medida em que os níveis de PAHs diminuem no verão, possivelmente explicado pela diminuição da atividade industrial e das necessidades de aquecimento doméstico.
- Em termos da contaminação atmosférica “direta”, houve ainda a possibilidade de participação num programa de recolha de amostras passivas de ar à escala Europeia, liderado pelo Prof. Kevin Jones da Universidade de Lancaster (Reino Unido), contribuindo-se com recolhas em diferentes pontos do território Português, incluindo as Regiões Autónomas. Os resultados (para os níveis e distribuição de PCBs, OCPs e BFRs) estão muito perto de ser divulgados. Agulhas e caruma de pontos de amostragem no Reino Unido e na Noruega foram também analisados em Lancaster e revelaram interessantes tendências de partição de PAHs, PCBs, OCPs e BFRs entre as duas matrizes, variáveis em função das características de cada família de compostos (dados a aguardar publicação em revista internacional).
- Finalmente, a análise de produtos de cuidado pessoal demonstrou uma presença ubíqua de musks, sendo galaxolide, cashmeran e exaltolide os mais comuns e mais concentrados. Um padrão semelhante foi verificado para as agulhas de pinheiro, onde o cashmeran e o galaxolide foram mais frequentemente detetados. Isto permite concluir que os produtos de cuidado pessoal são uma potencial fonte principal de emissão destes compostos para o meio ambiente.
Outras publicações e comunicações em congressos internacionais produzidas durante a execução deste projeto (por ordem cronológica decrescente):
Nuno Ratola, Vera Homem, José Avelino Silva, Rita Araújo, José Manuel Amigo, Lúcia Santos, Arminda Alves. Biomonitoring of pesticides by pine needles — Chemical scoring, risk of exposure, levels and trends, Science of the Total Environment 476-477 (2014) 114-124.
Nuno Ratola, José Avelino Silva, Sara Ramos, Vera Homem, Lúcia Santos, Arminda Alves. A multi-component method to quantify POPs and emergent pollutants using pine needles. Proc. of the 16th International Symposium on Advances in Extraction Technologies, ExTech 2014, Chania (Crete), Greece, 25 – 28 May 2014, p. 43 (Apresentação Oral).
Nuno Ratola, Vera Homem, José Avelino Silva, Rita Araújo, Arminda Alves. Biomonitoring of current use pesticides (CUPs) by pine needles. Proc. of the 2nd International Conference on Occupational & Environmental Toxicology, ICOETox 2013, Porto, Portugal, 16 – 17 September 2013, Poster 74 p. 131 (Poster).
José Avelino Silva, Nuno Ratola, Arminda Alves, Lúcia Santos. Comparison of different methods to quantify POPs and emergent pollutants using pine needles. Proc. of the 14th EuCheMS International Conference on Chemistry and the Environment, Barcelona, Spain, 25 – 28 June 2013, Poster PT 27 (Poster).
Vera Homem, Lúcia Santos, Arminda Alves. Human Exposure Assessment to Musks in the Metropolitan Area of Porto (Portugal). Proc. of the 14th EuCheMS International Conference on Chemistry and the Environment, Barcelona, Spain, 25 – 28 June 2013, Poster PT 17. (Poster)
Nuno Ratola, Jasmin K. Schuster, Lúcia Santos, Arminda Alves, Kevin C. Jones. POPs and PAHs in Norway and the UK – levels and distribution in pine needles, litter, soils and air. Proc. of the 14th EuCheMS International Conference on Chemistry and the Environment, Barcelona, Spain, 25 – 28 June 2013, Poster PT 17 (Apresentação Oral).
Nuno Ratola, Paulo Herbert, Arminda Alves. Microwave-assisted headspace solid-phase microextraction to quantify polycyclic aromatic hydrocarbons in pine trees. Analytical and Bioanalytical Chemistry 403 (2012) 1761-9.
Rita Araújo, Nuno Ratola, José Luís Moreira, Lúcia Santos, Arminda Alves. Different extraction approaches for the biomonitoring of pesticides in pine needles. Environmental Technology 33 (2012) 2359-68.
Nuno Ratola, Paulo Herbert, José Manuel Amigo, Sílvia Lacorte, Damià Barceló, Elefteria Psillakis, Arminda Alves. Biomonitoring of polycyclic aromatic hydrocarbons by pine needles – analytical alternatives and levels in Europe. Proc. of the 22nd SETAC Europe Annual Meeting, Berlin, Germany, 20 – 24 May 2012, TU252 (Poster).
Nuno Ratola, José Manuel Amigo, Amigo, Mónica S.N. Oliveira, Rita Araújo, José Avelino Silva, Arminda Alves. Differences between Pinus pinea and Pinus pinaster as bioindicators of polycyclic aromatic hydrocarbons. Environmental and Experimental Botany 72 (2011) 339-47.
Nuno Ratola, Paulo Herbert, Sílvia Lacorte, Damià Barceló, Elefteria Psillakis, Arminda Alves. Pine needles as natural passive samplers - several approaches for the extraction of polycyclic aromatic hydrocarbons. Proc. of the 21st SETAC Europe Annual Meeting, Milan, Italy, 15 – 19 May 2011, MO 026, p. 100 (Poster).
Alícia Navarro-Ortega, Nuno Ratola, Alain Hildebrandt, Arminda Alves, Sílvia Lacorte, Damià Barceló. Environmental distribution of PAHs in pine needles, soils and sediment matrices”, Environmental Science and Pollution Research, 19 (2012) 677-88.
Alícia Navarro-Ortega, Nuno Ratola, Alain Hildebrandt, Arminda Alves, Sílvia Lacorte, Damià Barceló. PAHs in Pine Needles, Soils and Sediment Matrices from the Ebro River Basin. Proc. of the 12th International Conference on Environmental Science and Technology, CEST 2011, Rhodes, Greece, 8 – 10 September 2011, A-1287 (Apresentação Oral). |